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quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

Saudade de um tempo dos outros

(Carlos Costa, Una visione onirica, quase mistica...)
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É possível sentir saudade do que não se conheceu? Ficar nostálgico por um tempo não vivido?
Vendo as cenas do último final de semana, da batalha nas arquibancadas envolvendo as "torcidas" de dois times de futebol, lembro meu pai me contando das suas idas aos estádios de Recife e Juazeiro na sua adolescência, e meus olhos brilham. De saudade.
Ele sempre gosta de lembrar como eram bons aqueles tempos, em que as torcidas diferentes se sentavam lado a lado, compartilhavam caronas, brincadeiras e gozações - todos no mais estrito respeito, sabedores de que aquilo não passava de diversão e não deveria, nunca, ser encarado como questão de vida ou morte. Aliás, isso sequer passava pela cabeça dos espectadores àquela época: a banalização da violência em estádios de futebol.
Lembro suas histórias de grandes amigos que torciam para outros times: algo impensável hoje em dia, ele os acompanhava nos jogos de seus times. E era por eles acompanhado também. Hoje em dia, é capaz de uma cidadezinha com vinte e dois habitantes do sexo masculino contar com dois times de futebol. Rivais. Inimigos mortais.
Meu velho sempre me conta, saudoso, o começo do fim: o momento em que, recém-chegado à capital alencarina, foi assistir a um jogo de uma equipe local contra o Flamengo. De Zico! Para sua zica (espero não ser apedrejado por esse trocadilho tão infame), calhou de entrar pelo portão errado.
Sejamos francos: quem não queria ver um jogo dele? Vamos, admita!, é como ver um jogo do Messi hoje em dia. Tá, não quero ser linchado por falar em um argentino: um jogo do Neymar. Opa, também serei vítima de agressões tão violentas como esse franzino jogador? Melhor parar de fazer comparações, então. 
O problema é que a transformação do futebol em momento ideal para extravasamento de ira, frustrações e decepções com tudo da vida havia começado naquele início dos anos oitenta. E meu pai não sabia.
Vestido de vermelho e preto, saiu do estádio sob escolta policial, com medo, assustado, sem entender aquela irracionalidade coletiva. Mas, acima de tudo, com saudade de um tempo que, recém-abandonado, já lhe parecia tão longe.

Isso, então, me faz voltar à questão inicial: posso ter saudade disso também, antes que seja (se é que já não é) tarde demais?

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